09/02/2007

É preciso votar



Termina hoje a campanha eleitoral do referendo da interrupção voluntária da gravidez. Oito anos depois da primeira auscultação do eleitorado volta a perguntar-se se há, ou não, razões para alterar o Código Penal. O debate público que mobilizou muitas forças políticas e sociais teve o mérito de nos questionar sobre princípios civilizacionais relevantes. Houve quem não se sentisse muito à vontade para os discutir com o alarido próprio das campanhas eleitorais. Houve quem radicalizasse o discurso e a atitude com pouca tolerância com os seus oponentes. Houve e há ainda quem não perceba que votar "sim" é tão legítimo como votar "não". E vice-versa.

Muitas vozes se ouviram, dentro e fora dos partidos, demonstrando que as fronteiras ideológicas nem sempre diferenciam questões de civilização, como é o caso da interrupção voluntária da gravidez. Na batalha política e dos argumentos ganhou nitidez uma clivagem fundamental: a religião. A campanha dividiu-se sobretudo entre os que se reconhecem no enraizamento católico e os que se reclamam laicistas. A fractura não é perfeita, porque há quem vote "sim" entre os católicos e quem vote "não" entre os laicos, mas as tendências dominantes derivam deste posicionamento cultural.

A legitimidade do "sim" e do "não" perante a pergunta que nos é colocada aconselha, ou melhor, exige, uma distinção clara de argumentos. O pior que pode resultar de uma campanha, que deve ser esclarecida, é baralhar os argumentos. Nos últimos dias, pretendeu-se confundir posições. De repente, pretende-se fazer passar a ideia de que votar "não" é a melhor maneira de garantir os resultados do "sim"... Pare- ce indiferente votar "sim" ou votar "não". E não é. Pode pensar-se que este reparo é apenas uma preocupação de quem tem uma resposta afirmativa para dar no domingo. Não é. Antes de mais, é uma questão de clareza e de responsabilidade. Há argumentos de peso para votar "não", tantos como para votar "sim". A escolha deve resultar de uma convicção que não precisa de habilidades nem de geometrias engenhosas.

Domingo, recorde-se, a pergunta é a seguinte: "Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?" Não há outra pergunta. É só esta. O que virá a seguir depende do sentido da nossa resposta. Seja "sim" ou seja "não", importa votar. Em consciência. Sem subterfúgios.

António José Teixeira ( DN online - 09/02/2007 )

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